março 15, 2012

Então... [3]





Amanheceu e uma impressão incômoda tomou conta de tudo o que havia. Fiquei muito tempo de olhos cerrados com medo de descobrir o que a vida me guardava de desagradável.
Não demorou para se revelar, apenas voltei à realidade perdida durante o sono e notei, não sem desconforto, que aquele era um dia seu. Daqueles em que você está presente em cada pormenor.
Começou errado, muito errado, porque abri meus olhos e não esbarrei com os seus: sonolentos, intensos e verdes.
Acho que não esquecerei a sensação do dia de hoje de, depois de tanto tempo vivendo este quarto vazio, despertar e perceber tão nitidamente que você realmente não estava ali.
O dia começou absolutamente errado. E permaneceu assim durante todos os seus infinitos segundos.
Estava tudo ali. A sala muito organizada, as torradas de pão de forma, a pressa. Não tinha suas meias espalhadas por toda a casa. Não tinha qualquer vestígio de atividade humana para me trazer irritação.

O sol escorria pelas janelas e anunciava a manhã que vinha preguiçosa e clara. Queimava meus olhos lambendo meu sono e eu lembro, nessa exata e deliciosa hora, do seu beijo de despedida.
E depois você estava lá do meu lado, guiando minha vida na segurança das suas grandes mãos firmes. Com o vento trazendo para as minhas narinas o perfume do seu cabelo com shampoo.
Veja só. Mesmo o vento que me acompanhava trazia sua presença.
O telefone tocou diversas vezes e aqui, neste pequeno mundinho reservado, eu reconheci rapidamente os números do identificador de chamadas sofri o típico formigar das mãos e a repentina falta de ar ao atendê-lo. Só que não.
É uma sequencia de sensações que sei que não terei nunca mais.
E de novo encontrei com você pelo caminho, durante o almoço e durante o happy hour. Nos casais que de súbito surgiram no meu dia, sorrido sem compostura. Na cerveja que um garçom servia para outro casal, também se rindo com os dentes assanhados. Você estava ali numa mulher solta em meio à multidão com o olhar perdido. E verde.
Durante todo este longo e minucioso dia houve tanta paz. Teve até fotos suas.
Tinha flores de jambo pelo chão. Teve trabalho, almoço.
Mas estava tudo errado. Esteve tudo errado porque nada foi absolutamente real.
Faltou você ali.
Faltou você aqui. Faltou seu tempero na minha cozinha e nas minhas torradas de pão de forma. Faltou seu perfume nas minhas roupas. Faltou você trazendo realidade e verdade para estas 24h perfeitas demais sem suas imperfeições planejadas, de cabelos despenteados e meias espalhadas.
E mesmo sem saber por quê, depois de tanto tempo vivendo este mundo solitário, eu percebi muito nitidamente que você não estava ali.
Faltou você. De verdade.




Sem textos alheios por hoje.

Um comentário:

Mari disse...

adorei! sempre adoro seus textos e não me canso de cometnar que "adorei" hahaha foi inspirador esse txto de verdade!! bjos