outubro 24, 2010

Adoro apelações baratas


Pontos finais podem, sim, substituir vírgulas, porém vírgulas não podem substituir pontos finais. A capital do Brasil não é Buenos Aires, mas já foi o Rio de Janeiro.Nem todos os nascidos no Rio e Janeiro são cariocas. Gordura não é sinônimo de bem alimentado.
Só para deixar bem explicado.

Eu não procuro pelos vivos, pois magicamente corpos caem à minha frente. Não escolhi, mas sempre acontece. Até quando não quero. E apesar dos iludidos serem mais felizes, não acho que fechar os olhos e fingir não enxergar o óbvio seja a melhor escolha - nem sequer é escolha: é covardia pura.

Apenas quem muito lê tem as palavras soltas e bem escolhidas, postas nos locais certos. A má escrita ou a escrita imatura é digna de quem ainda está preso à Heidi e ao Dicionário de Serafina - mas solicitando sempre ao Aurélio, só pra parecer poeta. Não funciona. E são os meus calos que me dão propriedade para o dizer.

Sonhos têm limites e o limite é: cresci. Isso não impede de se sonhar sonhos novos. Apenas serão sonhos alçados na realidade. Os sonhos puros ficarão para as madrugadas.

Mas de todos os seus medos, uma coisa é bem verdade: no meu corpo foram perdidas palavras e suspiros, e com ele dado muitos ensinamentos. Verdade incontestável.
Eu deixei o vento secar as palavras aqui pousadas, e de poucas ainda me recordo: o passado esqueci escrito em algum lugar e andei para frente. Muito à frente do que me encontrava. Pirraças caprichosas jamais irão me ofender e mudar alguma coisa, sobretudo, porque não condizem com nosso novo contexto econômico. Pirraças caprichosas e imaturas... Mas rendem risadas.

Está tudo fora do contexto e situação. A vida andou e quem estagnou não fui eu. Só que você não enchergará nada disso enquanto não se curar dessa sua paixão platônica por mim. Ms.



Crônica da Semana:

O perigo do Asterisco
(Bibi da Piève)

Chego à loja da operadora de celular e peço ajuda para mudar o meu plano. A moça pergunta se, por acaso, eu teria comigo duas cópias das duas últimas faturas da minha conta telefônica. Que azar, não tenho.

- Posso estar tentando digitar os dados aqui no computador, e solicitando uma segunda via...

Três tentativas - sempre no gerúndio -, e nada. Os dados não estão conferindo. Sim, eu tenho certeza, meu número é este. Meu CPF é este. Meu nome completo, com "b" de bola. Meu endereço. Meu telefone residencial. Tudo certinho.

- Sinto muito, senhora, mas os dados não conferem.

Chega uma hora na nossa vida em que, fatalmente, alguma coisa não confere. Pode ser uma simples etiqueta de calça jeans.

- Tem certeza que é 44? Mas ficou tão justinha...

Pode ser o contracheque. Pode ser o sapato azul-marinho do seu marido. Pior: o próprio marido - que, no particípio, era tão amado, mas, no dia-a-dia, faltou foi gerúndio. Se é que você está me compreendendo.

De repente, somos um amontoado de números que não se entendem entre si. Ou seja, o problema dos dados é que eles quase nunca se dão. São as ironias do mundo informatizado - para as quais sempre se tem uma solução imediata, ainda que ela seja a senha para outra janela de problemas insolúveis (ao menos, por alguém com mais de 14 anos).

- A senhora pode estar ligando para o asterisco-número-tal, e solicitando a segunda via de sua conta telefônica.

- Querida, muito agradecida. Fui.

Viro as costas e vou-me embora. Quando começam com esse papo de asterisco, pode crer que é mais aborrecimento. O asterisco é o maior 171 da paróquia. Só não vê quem não quer.

Na publicidade, ele reina absoluto. Páginas inteiras com anúncios em letras garrafais seduzem até não mais poder. Lá no fundo, escondidinho, um malicioso asterisco introduz o parágrafo esclarecedor: não era bem assim. Era só para os primeiros 20 que ligassem. Cujos nomes começassem com a letra K. Cujas mães tivessem carros cujos últimos dois algarismos das placas, subtraindo-se as datas de nascimento dos... (ad infinitum).

A zona do asterisco, portanto, sempre é a mais perigosa. Um pouco por ser a parte ruim, a perna que manca. Um pouco por requerer leitura contorcionista.

E se as pessoas da nossa vida viessem com asterisco?

Homem bonito, charmoso, sensual, 30 e poucos anos, sorrindo para você no trânsito. Asterisco: casadérrimo, pai de Camila e Leonardo.

Moça de parar o trânsito, alta, morena, sexy, cabelão pela cintura, voz rouca, dando a maior bola para você na saída da boate. Asterisco: não aceita cheque.

Esposa dedicada, divertida, companheira, nunca quer discutir a relação, jamais reclama do seu futebol às quartas-feiras, e até incentiva o chopinho com o pessoal do escritório às sextas. Asterisco: vem cá, você não tem dado falta do Geraldo nesse chopinho, não?

Tem gente que se nega a enxergar o asterisco dos outros. E há quem faça de tudo para esconder o próprio. Às vezes, durante toda uma vida.

Quem nunca ouviu um caso de velório onde, de uma hora para outra, aparece uma viúva não oficial carregando três ou quatro herdeiros-surpresa? Asterisco póstumo. Muito em voga.

Isso para não falar nos asteriscos de Brasília, que só aparecem carregando os herdeiros pela mão depois que você já apertou o verde para confirmar.

Aí ficamos nós assistindo àquele show de asteriscos, espetando-se uns aos outros, tudo para concluir a sentença máxima de quem empresta mas não contabiliza, fuma mas não traga, transa mas não goza: os dados não conferem.

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