março 19, 2009

Hibernando

My Diary:

Deu, caros amigos.
Este blog foi pro saco, pro beleléu, pro espaço, e é enterrado temporariamente. Não por falta de neuroses e confissões, pois estas sempre existirão - o que é óbvio para alguém que nasceu com o raro talento de engolir as palavras - mas por pura falta de capacidade de transformar transtornos em caracteres.
Se os últimos posts estavam longe de ser algo aceitável, agora, meus escritos chegaram no máximo da discrepância literária.
Daqui a pouco acabo com o meu "eu lírico", que há muito anda ofendido comigo e está me dando um "gelo".
Enfim, este é o fim temporário. Até que minha mente seja (talvez) capaz de escrever algo que preste novamente.Ou não.
Se não conseugir, eu apelo pra outra coisa.

Enquanto isso, as palavras... Leva-as o vento. [Título deum livro que eu nunca li. E nem quis]


Crônica da Semana:

Mulher Pelada
(Antônio Prata)

Toda sexta-feira ele chegava, num FIAT bege, para buscar a mim e a minha irmã. Pequenininhos, nos encaixávamos nos programas do pai separado e boêmio. Adorávamos: nos bares em que nos levava, éramos paparicados por mulheres bonitas e cheirosas, que riam alto e usavam roupas engraçadas. (Só muito mais tarde fui descobrir que a esse tipo de mulheres dá-se o nome de atrizes). Pedíamos coca, fanta e sprite e misturávamos tudo. Meu pai nos deixava comer pastéis, batatas-fritas, frango à passarinho e todo tipo de besteira, mandando por água abaixo, em minutos, toda a educação nutricional que minha mãe havia imposto durante a semana, com muito esforço, brócolis, sorrisos e papaias.
Nos períodos em que meu pai tinha alguma peça em cartaz, íamos ao teatro todo fim de semana. Lá pelos meus cinco anos, estreou a peça Besame Mucho. Era encenada no teatro Cultura Artística. Fica ali perto da Augusta, em meio a várias casas de strip e outros estabelecimentos cheios de neons e mistério, que eu olhava fascinado. Chegava a sentir uma certa pena do meu pai: o teatro dele me parecia o ponto mais desanimado de toda a rua, ofuscado por fachadas de castelos medievais, onde portas espelhadas davam para corredores esfumaçados e coloridos.
Perguntei o que eram aqueles lugares e meu pai disse que eram bares. Mas por que eram tão diferentes dos outros, em que comíamos frango a passarinho com Guara-cola? Meu pai explicou-me que naqueles bares havia mulheres peladas. Como?! Por que?! Do alto de minha meia década de existência, ?mulher pelada? evocava a imagem de minha mãe ou irmã entrando ou saindo do banho, de toca na cabeça e toalha na mão. Não conseguia imaginar muito bem que razão levaria mulheres nuas a comer pastéis. Meu pai seguiu a explicação, deixando-me ainda mais confuso: homens que não tinham namorada pagavam para ver aquelas mulheres peladas. Imaginei uns caras tristes, barba por fazer, a preencher palavras-cruzadas e bebericar um chope, enquanto mães e irmãs nuas iam e vinham de chuveiros inexistentes. A coisa não fazia o menor sentido. Pedi para irmos a um daqueles bares. Meu pai explicou que era proibido para crianças. Pela primeira vez, alguma coisa pareceu-me lógica. Devia ser para evitar que víssemos aqueles homens tristes e sozinhos, perdidos entre neons e tocas de banho.
Só vinte anos depois atravessei um daqueles corredores. As mulheres eram bem diferentes do que havia imaginado no meio de minha infância, mas os homens estavam lá, exatamente como eu os havia pintado.

Um comentário:

TUTA disse...

tá igual a mim.. não consigo escrever mais nenhuma palavra que combine com a seguinte. Meu 'eu lírico' ou morreu, ou vai me matar. Beijos.